Saturday, March 29, 2008

lullaby

hoje me olhei no espelho e percebi uma ruga que há muito não via.
não porque ela não mais existia, mas por ela ter se ocultado bem quietinha por lá, entre as minhas francas células epteliais.
as minhas rugas são eternas. infinitas.
senti o canto dos meus olhos se encherem de lágrimas ao percorrer por aquele espelho dedo-duro. lágrimas tão familiares que corri para segurá-las pelo máximo de instante que eu conseguiria.
improvisei um sorriso em seguida pra me convencer que tudo estaria bem, mas também foi uma tentativa inútil de me apoiar em "brilhos eternos".
aquilo [e isso] era um triste monólogo. mas não é mais. nem triste, e nem monólogo.
triste é tudo que tem fim. mas eu calculo o infinito.
triste é quem nunca teve uma ruga. mas eu tenho uma. várias. e cada vez mais.
triste é o que não se viveu. mas eu fiz mais que viver. amei.
triste é a lacuna que fica na memória. e eu tenho infinitas recordações.
triste é quem nunca ergueu um muro de concreto. e eu até pulei um.
triste é ver o varal vazio por não ter lençóis. e no meu tem até fronhas.
triste é a gelidez do monólogo.
triste é a chegada do botox.

1 comment:

Maurício Fonseca said...

"O que será que será
Que dá dentro da gente e que não devia
Que desacata a gente, que é revelia
Que é feito uma aguardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os ungüentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos, toda alquimia
Que nem todos os santos, será que será
O que não tem descanso, nem nunca terá
O que não tem cansaço, nem nunca terá
O que não tem limite"

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Essa é do Chico, mas se fosse eu autor, não ficaria surpreso da onde haveria de ter tirado tanta inspiração. É claro, a inspiração vem dos varais, dos lençóis, de muros e espelhos, de rugas e olheiras, dos medos, receios, mágoas, orgulhos - do amor. Da nossa vida. Obrigado pela visita e pela chance de desatar esse nó.